A reportagem da jornalista
Catarina Santos dá-nos a conhecer, não só a terrível odisseia que é a viagem
que estas populações fazem para chegar ao continente europeu, com uma
percentagem de sucesso absurda pois podemos sempre afirmar que a perda de uma
vida é sempre um acontecimento trágico. Questiono-me sempre como é possível que
um conjunto de nações desenvolvidas permite que haja pessoas a morrer no
mediterrâneo? Operações como “Mare
Nostrum” ou “Frontex” são
bem-vindas mas, infelizmente, insuficientes. Há todo um conjunto de questões
políticas que se prendem com um funcionamento “lento” das instituições de
decisão europeias. No entanto, com a chegada dos refugiados ao continente
europeu, é necessário dar uma resposta cabal e rápida a todas as necessidades
básicas que estas populações trazem consigo. As instituições no terreno dão o
seu melhor e conseguem-no fazer, como podemos constatar na reportagem, com o
testemunho de um refugiado que agradece e está grato por tudo o que fizeram por
ele. Conseguimos perceber que se encontra calmo, e que as necessidades básicas estão
satisfeitas. Nomeadamente a alimentação, a saúde, a habitação, acesso a água
potável, entre outros. Depois perguntamo-nos porque estão ainda tantos
refugiados nestes campos de acolhimento? Porque demoram tanto tempo a
serem-lhes concedidos os documentos? Porque não seguem com as suas vidas? As
respostas às necessidades básicas que estes refugiados trazem estão plasmadas
na reportagem e consistem numa resposta de uma Rede Social consubstanciada num
efetivo trabalho de parceria entre todos.
Após saírem, alguns, dos campos de refugiados, são encaminhados / distribuídos para os países de acolhimento onde os espera uma nova vida. Passam a uma nova fase até à autonomização dos projetos de vida com uma integração plena na comunidade de acolhimento. Aqui, é necessário ter-se criado, antes da chegada destas populações, competências de intervenção que facilitem as linhas de ação para o acolhimento destas populações. Deste modo, os atores no terreno deverão discutir e analisar as lógicas de ação a desenvolver para a realização de uma intervenção social eficaz. Deve-se ter em linha de conta a articulação de redes e parcerias sociocomunitárias, a criação destas caso não existam e, ao mesmo tempo e de uma forma transversal, o desenvolvimento de competências culturais fomentando a aceitação, por parte de todos os envolvidos, da diversidade, da diferença. Ou seja, sermos sensíveis a essa diferença aprendendo a aceitá-la e a viver com ela. Os domínios de intervenção passam pela saúde, habitação, educação, trabalho, lazer, sociabilidades, entre outros. Deve, pois, existir uma articulação entre todos estes contextos, conforme já referi.
O termo “inclusão”, segundo David Rodrigo (Público, 17-03-2014) surge para designar algo novo, uma evolução. Ainda, segundo este autor, …“Não é só o indivíduo que tem de procurar em se integrar na sociedade/ comunidade / escola mas estas estruturas têm pelo seu lado de se modificar, de se aproximar do individuo. A inclusão é um processo interativo, e assim sendo, tem que ser avaliado em duas dimensões: o que é o indivíduo pode fazer para se incluir e o que é que o “lugar da inclusão” faz para o incluir”. Ou seja, a inclusão é a possibilidade de “pertencer”.
É importante o conhecimento da língua, de modo a que os refugiados possam aspirar a ter autonomia. Assim, a educação / aprendizagem da língua do país de acolhimento é vital. Também a questão da habitação é importante, devendo os centros de acolhimento receberem estas populações de forma coordenada, quer sejam apenas indivíduos ou famílias. Progressivamente as preocupações devem-se centrar em questões como a integração destes indivíduos no mercado de trabalho, apoiá-los a encontrar habitação própria e fornecer-lhes também, caso seja necessário, apoio ao nível do sustento económico. Apoiá-los juridicamente, também, para a obtenção dos documentos e da legislação de interesse em vigor no país de acolhimento.
O Trabalho Social enfrenta hoje em dia um desafio enorme e tem um papel fulcral no contexto aqui já referido. Dá-se, deste modo, muita importância não só ao conhecimento teórico como também às metodologias para o Trabalho Social. Existem diversos modelos de intervenção no Trabalho Social onde se destacam alguns pela sua importância e influência na prática do Trabalho Social, nomeadamente, e só para nomear alguns, o de “Intervenção em Crises”, o de “Centrado na Tarefa” e o “Radical”. Estes Modelos poderiam ser aplicados na situação em concreto visionada na reportagem em causa. Além destes três Modelos refiro também os de Organização comunitária, nomeadamente o Local.
Refiro estes três pois gostei das perspetivas que estes Modelos contemplam. Assim, o Modelo de Intervenção em Crise consiste num método de ajuda com o objetivo de apoiar uma pessoa e / ou família que perante um processo traumático os efeitos negativos sejam minorados e sejam incrementadas as possibilidades de crescimento, de novas competências. Ou seja, apoiar de forma ativa a pessoa em crise e apoiá-la a mobilizar os seus recursos para superar o problema e recuperar o equilíbrio emocional. É interessante referir que este modelo não dá especial relevo à história da pessoa em questão. Especialmente nos momentos iniciais da intervenção. É uma intervenção centrada e estruturada e não se deve prolongar indefinidamente no tempo (uma a seis semanas segundo Caplan (1965).
Já o Modelo Centrado na Tarefa destina-se a intervenções nas quais têm que estar reunidas as seguintes três condições: a) o problema de intervenção tem que se encontrar isolado, bem limitado e conciso; b) o indivíduo em causa, alvo da intervenção, tem que reconhecer explicitamente a situação a intervir como um problema e desejar a sua resolução; c) o problema tem que ser acessível à ação do indivíduo. Também se propõe alcançar, num espaço curto de tempo, como o Modelo anterior, os objetivos definidos concebendo uma preocupação maior com o problema do que com as causas.
O Modelo Radical destina-se às situações em que se comprove que o enfoque da intervenção passe por uma intervenção social, por uma mudança radical, revolucionária, das condições estruturais da vida nos indivíduos ou comunidades. Este Modelo tem uma prática ativista, no qual o papel do assistente social é o de consciencializar a população, desempenhando a reflexão crítica um papel preponderante neste processo; denunciar as injustiças; revelar as causas que provocam os problemas sociais; ajudar as pessoas a entenderem os seus problemas como manifestação das condições estruturais; neutralizar os enfoques patologistas e vitimizantes; favorecer a participação; incentivar os processos de auto-organização num quadro político.
Em qualquer um destes Modelos, acredita-se no indivíduo com capacidades e recursos, com poder para superar as dificuldades. Também é interessante perceber a mediação do Assistente Social em cada um destes três modelos. Enquanto no primeiro dá-se enfoque a uma relação de confiança e de empatia, de escuta ativa no qual a comunicação não-verbal predomina sobre a verbal. Já no segundo Modelo referido, Centrado na Tarefa, há uma dinâmica relacional positiva a qual é vital e estruturadora na intervenção. O Assistente comporta-se como facilitador da ação. Finalmente, e no terceiro Modelo, a relação baseia-se em princípios democráticos de igualdade, equidade, confiança e respeito.
Não posso deixar de mencionar, tal como referi, os Modelos de Organização Comunitária nomeadamente o Local onde a comunidade está envolvida na intervenção e o Assistente Social é um elemento catalisador, coordenador da intervenção. Como exemplo deste Modelo pode-se mencionar a implementação de um projeto de intervenção com vista à inserção social. Este Modelo tem como objetivo integrar e capacitar a comunidade. Os diferentes grupos da população são envolvidos na definição dos problemas e na estratégia da intervenção. A comunicação e a discussão em pequenos grupos são a estratégia adotada para a orientação na realização de tarefas.
Penso que não existe um Modelo único de intervenção social, devendo-se retirar o que há de melhor em cada um aplicando-o na situação em concreto, articulando todas as forças vivas que atuam nos diferentes domínios. Juntamente com estes atores também é muito importante realizar todo um trabalho com o refugiado / populações refugiadas.
Poderia responder a uma situação de inclusão de refugiados em Portugal seguindo a Metodologia “AFIR”, ou seja, Antecipar, Fomentar, Implicar e Robustecer. O trabalho de intervenção social deveria ser considerado primeiramente num plano Nacional, no qual se poderiam identificar e potenciar os concelhos mais adequados para receberem estas populações, baseando a escolha em fatores tão diversos como por exemplo a baixa natalidade, o envelhecimento da população ou a existência / inexistência de infraestruturas básicas, como de saúde, habitação, emprego, entre outras e, também, as de cariz social. Posteriormente, a nível do Concelho e da Segurança Social com a identificação das entidades vivas, fossem estas públicas ou privadas. Destas reuniões seria constituído um Núcleo Dinamizador que teria a responsabilidade de criar o Programa de Intervenção Social a nível local. Deveria ser criado um Plano de Trabalho no qual se estabeleceria e calendarizariam as tarefas a ser desenvolvidas, definindo os responsáveis. Deveria ser realizada a recolha de informação e o tratamento e compilação da mesma com a criação de um Pré-Diagnóstico (discussão e aprovação) que levaria à criação posterior de um Diagnóstico. Este Diagnóstico, para ser criado, teria que envolver elementos responsáveis dos diferentes domínios, como a saúde, educação, emprego, etc. os quais identificariam os principais problemas os quais seriam agrupados por problemáticas com a definição das mesmas. A partir deste levantamento, equipas de trabalho especializadas – com técnicos e atores locais com saberes especializados – trabalhariam nos problemas identificados anteriormente. Estes grupos de trabalho teriam de constituir matrizes SWOT de acordo com as problemáticas definidas para cada um deles. Estas matrizes SWOT apontam / identificam as fraquezas, as ameaças, as oportunidades e as forças das problemáticas. Seguidamente e através de uma possível metodologia / modelo de aplicação seriam definidas prioridades baseadas no seu grau de importância e urgência, em cada uma das áreas. Para este efeito poderiam ser construídas Grelhas de Análise de Prioridades. Finalmente chegar-se-ia à construção do documento de Diagnóstico, aqui já referido. Este Diagnóstico deverá ser discutido e aprovado.
Após o levantamento do Diagnóstico passa-se para a criação do Plano de Desenvolvimento Social (PDS), estratégico, no qual se plasmam as estratégias de intervenção e os objetivos a alcançar para um período de três a cinco anos. Neste Plano deverão constar uma série de elementos que farão parte do Plano, por exemplo, a estratégia e os objetivos específicos, entre outros. A seguir a este plano deve ser traçado o Plano de Ação que consiste na identificação dos projetos e intervenções previstas. Este documento tem que ser forçosamente realizável com a participação de todas as forças envolvidas a nível local. Este Plano de Ação tem que se “apoiar” em Sistemas de Informação, fulcrais para o sucesso de implementação.
Conclusão
Como se pode constatar, um processo de intervenção social, com vista à inclusão de refugiados não é um processo fácil, bem pelo contrário. Implica muito mais do que boas vontades e voluntarismo. Implica, de facto, uma estrutura bem montada, já com provas dadas e fundamentada em teorias já testados em situações práticas que ocorreram já noutras situações, com profissionais especializados nas suas diferentes áreas de intervenção e bem articulados. Só assim se poderá dar uma resposta eficaz a um desafio tão grande, complexo e problemático como este, dos refugiados.
Luís António Matos Pereira – 13/11/2016
Caro Luís
É isso mesmo. Fantástico. Mobilizou de forma absolutamente exemplar os contributos dos materiais de apoio, articulando-os e tendo por referência a reportagem visionada. Nota 20!
É efetivamente como diz. Não existem modelos únicos nem prontos a aplicar. O que existe é um conjunto de procedimentos que devem ser mobilizados considerando cada situação em concreto, tirando partido do conhecimento (teórico) que já existe mas não ficando fechado em modelos rígidos pré-estabelecidos que em nada contribuiriam para passar a uma ação prática eficaz nos seus resultados. Porque cada caso é um caso. Por isso que, desde o início do módulo, insisto no "conhecer para agir".
Temos já estabilizadas metodologias de trabalho na área da intervenção social que nos permitem desenvolver as etapas que tão bem sintetizou.
Mais contributos, aguardam-se ;)
PSS
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